Quanto mais você olha para dentro do abismo, mais o abismo olha para dentro de você. Assim nos dizem que disse (mais ou menos) Nietzsche. Mas e quando você é o próprio abismo? Trevas pra trevas, papo reto ali, tudo certo. Quites. O caos que habita em certas esferas não tem data de início e nem tampouco prazo de validade. Ele só existe ali, soberano, inspirando enquanto se expira, a pele por debaixo da pele, a opacidade por detrás do brilho dos olhos. Ele comanda tudo que você ousa tocar, jamais te fazendo esquecer que ele estará de mãos dadas contigo para sempre. Toma tua sina.
~ Quando você passa a vida inteira tendo seu modo de existir deslegitimado pelos mais próximos, sendo tida por imatura, imprudente, volátil, irresponsável (quando lhes é conveniente nomear assim), uma hora você sucumbe. Não necessariamente desiste, mas cansa. E volta pro lugar que a vida sempre te reservou: na janela do bonde. ~
"(...) Eu te disse que estava cansado de cerzir aquela matéria gasta no fundo de mim, exausto de recobri-la às vezes de veludo, outras de cetim, purpurina ou seda - mas sabendo que no fundo permanecia aquela pobre estopa rasgada.
Perguntaste se o que me doía era a consciência. Eu te disse que o que me doía era não conseguir aceitar minha pobreza. E que eu não sabia até quando conseguiria disfarçar com outros panos aquele outro, puído e desbotado, e que eu precisava tecer todos os dias meus dias inteiros e inventar meus encontros e minhas alegrias e forjar esperas e me cercar de bruxos anjos profetas e que naquele momento eu achava que não conseguiria mais continuar tecendo inventos.(...)" Caio Fernando Abreu
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