A Sua




Sim, eu estava fugindo dessa conversa. Senta aí na minha frente, deixa eu te olhar nos olhos pra ter um estímulo, uma luz, um sinal, qualquer coisa que me dê coragem de descarnar o sentimento,jogar álcool na ferida, colocar tudo em alto contraste na minha frente e analisar.Eu só preciso que tu saias um pouco de tão dentro de mim, não vou soltar tua mão, prometo. É só que eu não posso olhar pra todo o quadro da situação contigo impregnado em mim, por detrás dos meus olhos, entre meus lábios, expirando enquanto eu inspiro...

Eu costumava viver tranqüila com a tua coexistência, éramos uma unidade harmoniosa: eu não te prendia e nem tu me cegavas,eu não te calava e nem tu abafavas minha voz com gritos alucinados.Jamais, jamais um de nós tomou inteiramente o controle nas mãos, subjugando a outra parte às suas vontades e delírios.O que fizeste com a confiança depositada nessa cumplicidade?

Não venhas me dizer que foste tocado de forma nunca antes conhecida. Eu fui tocada também, uma vez que éramos um só. Por que tomaste as rédeas da situação?Eu que era tão sã, tão equilibrada, tão... me vi acorrentada num querer doar-se, numa abdicação tão grande das minhas necessidades mais primordiais como o amor-próprio,numa auto-flagelação feita com chicote de plumas.

Tu me fizeste contentar-me com coisas que qualquer outra pessoa com o mínimo de discernimento mental e moral acharia irrisório e indigno do trabalho empregado.Pior do que contentar-me, eu me regojizava.Percebes a dimensão das tuas atitudes?Eu me enxergava completa, realizada e plenamente feliz. Completa por uma presença que nem estava por completa ao meu lado,completa por respirar o ar que rodeava aquela presença não-completa, por ouvi-la falar da outra presença que estava longe. A presença longe que a tinha perto, que a completava, a presença que não era minha. Como tu me deixaste sentir isso?

Não, eu não quero que tu sumas de mim.Eu sou feita pra e por você da cabeça aos pés, lembra? Eu só preciso que o controle volte a ficar equilibrado,preciso da minha visão e voz de volta, das minhas pernas e braços, da minha mente. Não, eu não te culpo e não, eu não sofri. Só senti demais, vivi demais;isso exige mais do que sofrer.

Vem, Amor, pode voltar aqui pra dentro.

domingo, 11 de janeiro de 2009

7 Comments:

Kika Macedo said...

eita!
arrebentou...
sei como se sentes, ja passei por isso..
e vc usou as palavras corretas..

LINDO texto..

num some mais não!

beijos

Camila said...

Lindo. Te disse, né? =)
E esse "Vem, Amor, pode voltar aqui pra dentro." lembra até uma música que eu fiz semana passada.

Cheiro.
;*

Gabriela Castelo said...

Mai,
Acho que fui uma das primeiras a ler esse texto, extremamente formidável e ao mesmo tempo, tão racional, tão nutritivo, sentimentalmente falando. Olha já passei por uma situação semelhante à essa, há um tempo atrás... isso acaba com qualquer reação física de um ser. Mas, sim... O Texto quando li pela primeira vez, me arrepiei! Lembra do que eu te disse?!
Beijos. Te cuida, mulher!

MLMM said...

"..me vi acorrentada num querer doar-se, numa abdicação tão grande das minhas necessidades mais primordiais como o amor-próprio,numa auto-flagelação feita com chicote de plumas."

"Completa por uma presença que nem estava por completa ao meu lado,completa por respirar o ar que rodeava aquela presença não-completa, por ouvi-la falar da outra presença que estava longe. A presença longe que a tinha perto, que a completava, a presença que não era minha. Como tu me deixaste sentir isso?"

"Só senti demais, vivi demais;isso exige mais do que sofrer."


Tu sempre me deixas sem palavras.
Fabuloso. Dolorido, mas fabuloso.

Ra said...

nem tão fabuloso assim


vc escrevia melhor antes...


(minha sinceridade me mata, eu sei)

te adoro ~

Juliana CBF said...

"(...)me vi acorrentada num querer doar-se, numa abdicação tão grande das minhas necessidades mais primordiais como o amor-próprio,numa auto-flagelação feita com chicote de plumas."

Eu to vivendo isso Mai!
Explêndido!
Vou roubar pra mim!

Isa Zeta said...

"(...)me vi acorrentada num querer doar-se, numa abdicação tão grande das minhas necessidades mais primordiais como o amor-próprio,numa auto-flagelação feita com chicote de plumas."

Sem palavras.

Sim, compartilhe comigo a tua história!

 
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