Às vezes me preservo

...noutras suicido.

Escrevi isso há uns meses atrás e estou postando por puro bloqueio literário. Tempos de letras magras. Parece até com o post anterior, mas esse é mais recente e foi escrito sob outras circunstâncias. Por mais iguais que eles sejam, são essencialmente diferentes.

[Ah, meu bem... posso tentar transmitir meus pensamentos? Estou aqui sentada naquela parte do parque, sob a sobra daquela "nossa" árvore que nunca descobrimos ao certo de que é, olhando o vento carregar as folhas e os dentes-de-leão. Onde estará você? Provavelmente saindo do banho para se arrumar para o seu grande dia.

Olhando um pouco adiante, eu posso ver o lago.Lembra dos nossos piqueniques, nossos sanduíches de patê, o suco já quente do sol? Eu fugindo das abelhas, tirando as torradas com mel do alcance delas e você rindo me chamando de frouxa.O sol começa a descer no horizonte. Agora você deve estar rodeada pela sua mãe, tias, primas e algumas amigas, colocando o perfeito vestido branco, enquanto segura as lágrimas e abre o sorriso.

Desculpa, na nossa última conversa eu disse que tinha parado de fumar.Eu menti, nunca parei. Mas você já sabia disso, conhece minha voz e minhas entrelinhas. Fumando agora, entre uma tragada e um pensamento, atiro uma pedra na superfície do lago, pra ver quantas vezes ela quica antes de afundar irremediavalmente nas águas escuras.Eu sempre ganhava de você, haha...Você deve ter começado a se maquiar, espalhando todos os seus apetrechos que eu tão afetuosamente ficava olhando você mexer enquanto a hora a avançava e nos atrasávamos para o nosso compromisso. Mas valia a pena, eu ficava ali em um silêncio de veneração, olhando você se arrumar. Talvez você use aquele batom de grife que eu te dei. Seria no mínimo irônico sua boca dizer "eu aceito", pintada no vermelho que eu escolhi a dedo.

O sol já se pôs atrás das colinas, os grilos já fazem aquele barulho que você detestava. Estou voltando pro carro, e é impossível não imaginar que nesse exato instante você também deve estar entrando em um carro com o buquê nas mãos, o sorriso mais lindo de todo o universo estampado no rosto.

(...)

Chego no lugar da cerimônia e num arrepio que não consigo decifrar se é bom ou ruim, te vejo vindo de mãos dadas com a tua escolhida.Nossos olhares se cruzam, eu deixo o lírio branco que trazia nas mãos no tapete vermelho e antes que tua boca forme o meu nome, vou embora.Não quero saber se chegará a trocar alianças, não quero pensar nos seus votos nem na sua lua-de-mel. Só queria ver a felicidade estampada no seu rosto, pra que eu pudesse respirar e dizer "ela está bem". Daqui pra frente,nada me fará mais feliz que isso.]



[Ouvindo Naquela Estação, na voz de Adriana Calcanhotto.]

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Vale a pena ler de novo [ou não]

Sim, postando de novo.
Estava lendo os meus escritos passados e me deparei com este. Tinha esquecido do quanto eu gosto dele... então tá aí ele de novo, porque se eu for escrever alguma coisa no estado em que estou, ia machucar. Ia ser forte, doído e direcionado.Talvez a pessoa nem lesse, mas como sempre há a chance, ela iria se ferir e não, não quero isso, nem pra mim, nem pra pessoa.


Entrelinhas

Lembra? Nós costumávamos ir naquela parte da praia por essas horas.Você dobrava sua calça porque não gostava de sentir a barra molhada tocando na perna, me pegava pela mão e íamos para perto da água.Com as ondas tocando baixo nossos pés e o vento bagunçando nossos cabelos, eu envolvia tua cintura com meus braços e ficávamos assim, abraçadas, até o sol se pôr.A tarde se lacrava com o encontro dos nossos lábios. Depois, fazíamos aquela nossa coisa: escrever trechos de músicas na areia molhada.Como para que não durassem e nós tivéssemos que retornar pra deixar outra inscrição; e outra, e mais outra.

Logo deixamos de escrever apenas na areia molhada.Ah, você lembra de como era gostoso encontrar nossas juras secretas em cada canto inusitado da vida?Pois é... Ainda sinto um leve espasmo quando me lembro da primeira vez que li um trecho de Cássia no espelho do banheiro.Foi bom, foi bom... Você sorria e dizia sonhar em me escrever Cazuza na neve.

Parecíamos viver com uma trilha sonora! Acho que é impossível eu olhar para qualquer CD dessa estante e não associar uma música a algum momento nosso ou a alguma parte do seu corpo.Você está em cada faixa.

Ah, sabe do quê eu me lembrei?De quando eu escrevia na sua agenda com caneta verde alguma música em inglês. Você detestava as duas coisas: a caneta verde e a língua inglesa.E eu docemente lançava o desafio para que você traduzisse. Em troca, você escrevia nos meus cadernos com caneta vermelha alguma coisa em francês.Ainda guardo o dicionário...

Estou sentada agora no sofá.Aquele mesmo onde nos sentávamos depois de um dia particularmente estressante e cuidávamos uma da outra.Aquele sofá que nos custou caro, que nos fez economizar em tudo e nos propiciou os melhores jantares à luz de velas, uma vez que tínhamos que reduzir a conta de energia. Aquele mesmo sofá onde me deitei aquele dia e chorei.

Você não lembra porque não estava aqui.

Daqui eu olho a escrivaninha escura. Aquela, onde você me deixou um papel escrito Cazuza, em caneta azul, junto com a chave do apartamento.Bom, no mínimo, irônico. Cazuza. Nada de neve,só a madeira escura. E a caneta azul, dessas baratinhas mesmo,que a tinta borra tudo.

Falo com a sua secretária eletrônica, que nem ao menos tem uma música agradável de recepção.Só aquela tentativa de reproduzir algo erudito.E eu sei que você está me ouvindo, só não quer atender.Mas essa foi a primeira e última ligação. Meu repertório acabou. Fico só com um requiem, sem letra para te escrever os trechos. Pode ficar com ele todo.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

 
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